quinta-feira, 8 de julho de 2010

Conversa dos quarentões











Maurício: "Quem já entrou na Casa dos Quarenta sabe o que estou sentindo. Eu entrei. E a porta se fechou atrás de mim. As tábuas rangiam sob os meus pés. Tento fugir mas já não encontro o trinco da porta."
Amanhã, dia 10 de julho, levanto acampamento e me mudo definitivamente para a Casa dos Quarenta. Nunca imaginei que chegaria a esse ponto. Quando eu mal entrava na Casa dos Vinte, uma namorada me disse que era espantoso eu ainda estar vivo, pelo jeito que atravessava a rua, olhando pro tempo, ao invés de para a direita e esquerda. O fato é que eu consegui atravessar muitas ruas até chegar aqui, às portas da Casa dos Quarenta, ileso, sem nenhum acidente.
Helena: "E pensar que eu passei pela Casa dos Trinta sem aproveitar nada. Olhei para a Casa dos Quarenta e achei atraente. Me imaginava madura, realizada. Entrei. Não podia imaginar que a Casa dos Quarenta seria assim por dentro. Perdi a festa da Casa dos Trinta e agora não posso voltar."
A Casa dos Trinta não foi muito condescendente comigo. Pelo menos não fisicamente. Ganhei barriga e algumas dezenas de amaldiçoados quilos a mais. Uma diminuição preocupante do fôlego e do bom e velho preparo físico. E uma barba cerrada que uma amiga insiste em dizer que me faz parecer um grande cineasta. A Casa dos Vinte foi mais generosa. Namoradas, trabalhos, viagens, amigos, muita coisa boa. Se bem que a experiência que a Casa dos Trinta deixou foi inigualável. Parece que tem coisas que a gente só aprende mesmo com o tempo.
Maurício: "E aqui estou eu, cercado de fantasmas, suando frio e me apalpando. As pessoas invariavelmente começam a se apalpar na Casa dos Quarenta. Para verem se é verdade, e que dorzinha é aquela."
Não compartilho da crise pessoal que muita gente atravessa ao se deparar com a Casa dos Quarenta. Quando entrei na Casa dos Trinta, me disseram que a vida começava lá. Hoje, dez anos depois, tenho a forte suspeita de que a vida começa aqui. Se bem que a vida começou mesmo há várias casas atrás. Minha infância foi fantástica! Talvez seja por isso que carrego ela comigo até hoje. Suspeito que vou precisar muito dela aqui, na Casa dos Quarenta.
Helena: "Tento desistir da idéia, tento voltar. Invento que esqueci minha bolsa na Casa dos Trinta, a saída. Mas só há uma saída na Casa dos Quarenta: a que dá para a Casa dos Cinquenta."
Meu avô morreu na Casa dos Oitenta. Meu pai na Casa dos Setenta e minha mãe na Casa dos Sessenta. Agora, entregando as chaves da Casa dos Trinta e seguindo em frente, percebo que pra sair da Rua dos 'Enta, só se cruzar a barreira dos Cem. De preferência com cinto de segurança, airbag e com o motor sempre revisado. Mas não que sair da Rua dos 'Enta seja fundamental. O importante mesmo é saber curtir a vida. E evitar pegar friagem e nunca esquecer de comer vegetais.
Maurício: "Depois de uma certa idade a gente só enxerga os pés de longe, lá embaixo... e nós já fomos tão íntimos! Quando eu era bebê brincava com meus pés. Mordia, lambia. Depois nunca mais estivemos tão próximos. Às vezes tento visitá-los, mas a coluna não deixa. Viver é ir lentamente se distanciando dos pés."
Há uns anos atrás estava conversando com um velho amigo e surgiu o assunto de que já não éramos mais jovens. Daí pra falar de pequenas dores, herança genética e remédios foi um pulo. Quer dizer, pulo não, porque nos faltava o preparo físico. O pior foi perceber, no meio do papo hipocondríaco, que alguns anos antes nós costumávamos falar de namoradas, festas e prazeres mais apropriados à juventude. Batemos na boca e deixamos de lado a conversa quase mórbida, para nunca mais retomá-la.
Helena: "A vida é como uma gangorra. Quando você chega aos quarenta, está no topo. Tem uma visão privilegiada de tudo. Se sente realizada, superior, a tal. Por dezessete segundos. Depois começa a descida."
Sempre convivi com pessoas bem mais velhas e bem mais novas do que eu, sem o menor problema. Porém tenho algo que classifico como uma "disfunção mental", que desde sempre me fez sentir como se tivesse a "idade certa". E o resto do mundo a "idade errada" (como se isso existisse!). Isto é, não importa se eu tinha 8, 12, 19, 27, 33 ou 39 anos, eu sempre estava na idade que se deveria ter para curtir a vida adoidado. E quem era bem mais velho ou bem mais novo que eu, estava com algum problema. Sim, eu sei, é uma visão maluca, torta e egocêntrica da vida. Mas eu sempre senti as coisas dessa forma, instintivamente. Sim, quando penso nisso, também acho uma besteira completa. Tomara que na Casa dos Quarenta eu não queira brigar comigo mesmo por encarar o mundo desse jeito.
Maurício: "Na verdade é que aos quarenta, pela primeira vez na vida você se dá conta que vai morrer. Que a morte não é como briga de casal, que só acontece com o vizinho. Fazer quarenta anos é o avesso de entrar na Academia de Letras: você ganha uma festa e se torna um mortal."
De uma certa forma, a morte sempre me acompanhou. Já perdi amigos, parentes, pai, mãe. Como a maioria das pessoas, pensei muito em morte na adolescência. Felizmente isso passou. Até um tempo atrás. Mas isso também passou. A morte, como é encarada pelo ocidente, não faz parte da minha vida. Minha mãe era messiânica e aprendi muito com a cultura oriental sobre a vida e a morte. Neil Gaiman, Akira Kurosawa e Allan Kardec me mostraram que a morte nada mais é do que uma passagem, e uma parte tão importante da vida quanto qualquer outra. Sem falar que é inexorável. Afinal, da vida, uma das poucas certezas que temos é de que ninguém sairá vivo dela.
Helena: "Aos quarenta anos você entra na meia-idade. Chama-se meia-idade porque é um meio termo. É quando o espírito meio que quer e a carne meio que não pode mais. Na meia-idade tudo é pela metade. A meia-idade é uma mer..."
Quando eu tinha 17, 19 anos, comecei a me fascinar por mulheres mais velhas. Sempre namorei mulheres mais velhas que eu. Na Casa dos Vinte tive duas namoradas da minha idade. Até que ao entrar na Casa dos Trinta me apaixonei à primeira vista por uma bela menina. Pela conversa e maturidade, pensava que ela tinha 25 anos. Quando já estava irremediavelmente louco por ela, após o começo do relacionamento, descobri que ela tinha... 16 anos! Passei algumas semanas me xingando no espelho do banheiro, com preconceito contra mim mesmo. Mas apesar de ter que encarar um infame "papa-anjo" sempre que escovava os dentes, tudo se resolveu. Afinal eu sempre aparentei ser mais novo e ela jurava que eu tinha 23 anos. No balanço das coisas, ela era dois anos mais velha que eu, hehehe!
Maurício: "À medida em que a gente vai envelhecendo, as letras diminuem! Jornal, catálogo telefônico, bula de remédio. Devia ser o contrário. As crianças aprenderiam a lerem grandes livros de filosofia, com a letrinha miúda. E na velhice as letras ficariam progressivamente maiores. À medida que nossos olhos se cansam."
Bem, a porta da Casa dos Quarenta já se assoma diante de mim. Entro da Rua dos 'Enta talvez para nunca mais sair. Vamos ver o que essa Casa, essa Rua têm a me ensinar. Pois depois de quatro décadas, pelo menos uma certeza eu tenho. Como diria Indiana Jones, "o que importa não são os anos, e sim a quilometragem"!

Texto de Oswaldo Lopes Jr. (na véspera de entrar na Casa dos Quarenta) e de Luís Fernando Veríssimo.

Agora a fotinho da casa dos inte rs.. fresca eu não acham rs...mas eu chegarei la se Deus quiser,mas por enquanto vou desfrutar cada casa com cautela e mt amor.






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